As atividades policiais de natureza especial desenvolvem-se a fim de serem empregadas, principalmente, como última resposta da força estatal em situações extremas ou de risco elevado, momento em que as forças convencionais não são mais capazes de oferecer uma solução aceitável à resolução da crise enfrentada. Os dois livros antecessores a este, Charlie Oscar Tango – Por dentro do grupo especial da Polícia Federal e Oscar Alfa – Utilização de operadores anfíbios na Polícia Federal, já aprofundaram os conceitos de operações especiais, como se pode observar no trecho reproduzido abaixo, os quais não serão mais abordados no decorrer deste a fim de evitar repetições incômodas aos leitores.
A criação e o emprego de unidades de operações especiais no meio policial são recentes, remontando à década de 1960. O principal objetivo da utilização desses grupos é o Estado oferecer, à sociedade, uma resposta apropriada e com níveis adequados de segurança contra as práticas criminosas mais severas e violentas, que exigem utilização de recursos humanos, tecnológicos, materiais diferenciados e especializados principalmente nos casos onde há uma incapacidade ou insuficiência de reação por parte das unidades convencionais ou dos meios normais de contenção. Os grupos de operações especiais são equipes autônomas de alto desempenho, preparadas e responsáveis para dar a última resposta em eventos de crise e cenários de grande incerteza, podendo atuar de forma independente ou em cooperação com outras forças. Todas as ações devem ser pautadas pela obediência ao ordenamento jurídico vigente, atendendo a princípios como proporcionalidade e adequabilidade (trecho extraído do Capítulo Introdução, de Oscar Alfa).
Nesse contexto, a Polícia Federal criou, em sua estrutura, no final da década de 1980, o COT - Comando de Operações Táticas a fim de servir como a sua força especial e atuar como último refúgio nos casos que demandassem utilização de meios diferenciados. Missão essa desempenhada de maneira exemplar desde a sua origem. A partir disso, o COT foi ampliando suas atividades e seus recursos materiais e de pessoal, com pesados investimentos na capacitação dos policiais federais, no desenvolvimento e no aprimoramento de doutrina de operações especiais e na aquisição de equipamentos que atendessem à demanda e às características das operações realizadas, fossem terrestres, anfíbias ou aéreas. Isso resultou na expansão do número de operadores, na construção de uma nova sede e em estruturas agregadas, e na aquisição, na renovação ou na modernização de equipamentos, como viaturas, embarcações, materiais de mergulho, alpinismo e paraquedismo, armamento e acessórios, uniformes e EPIs, drones, dentre outros.
Apesar da excelente capacidade de resposta e do altíssimo nível técnico disponibilizados por aquele Comando ao Estado, em razão da sua concentração na Capital Federal e da elevada procura pelos seus serviços, posteriormente agravadas pela realização dos grandes eventos esportivos neste País, tornou-se inevitável reforçar sua capacidade e buscar uma maneira de descentralizar essas atividades. Assim, em 2009, criaram-se, na maioria dos estados da Federação, os GPIs – Grupos de Pronta Intervenção da Polícia Federal, subordinados estruturalmente e hierarquicamente às respectivas Superintendências Regionais e doutrinariamente ao COT, com objetivo de dar uma pronta resposta aos eventos de crise e nas operações de elevado risco. Maiores detalhes da criação e do funcionamento destes grupos serão revelados nos próximos capítulos.
Essa descentralização, ao mesmo tempo em que foi um importante passo em busca de maior agilidade no atendimento de ocorrências as quais demandam o emprego de força diferenciada nos estados, contribuiu com o fortalecendo do próprio Comando de Operações Táticas. Esse ganhou fôlego para investir na evolução de sua doutrina, nos treinamentos e na sua aptidão para o ensino, compartilhando o conhecimento dentro da Polícia Federal e com forças de segurança nacionais e estrangeiras. Possibilitou, igualmente, maior dedicação a missões de elevadíssimo risco, com necessidade de emprego, por exemplo, de atiradores de precisão, paraquedistas, mergulhadores e negociadores. Outra vantagem colhida desse novo modelo foi a possibilidade de atuação conjunta entre o COT e GPIs, ampliando consideravelmente o número de operadores, multiplicando os meios.
Os Grupos de Pronta Intervenção atuam tanto isoladamente quanto de forma conjunta com outras forças. Utilizam-se em diversificados tipos de operações, dentre elas: combate ao tráfico de drogas e de armas, combate aos crimes contra o patrimônio e ao crime organizado, contraterrorismo, prisão de membros de facções criminosas, prisões que possam gerar grande comoção ou revolta popular (pessoas de grande notoriedade), proteção de dignitários, escolta de comboios sensíveis, operações de choque, enfim, todas as situações que envolvam elevado risco na execução.
A fim de garantir o sucesso do seu emprego nas mais variadas missões, os operadores passam por rigorosa capacitação inicial, de caráter eliminatório, com a formação no CTI – Curso de Técnicas de Intervenção, ministrado pelo COT e com duração aproximada de 45 dias. Após essa etapa obrigatória, os policiais são submetidos a uma capacitação continuada, com inúmeras possibilidades de cursos oferecidos em instituições policiais e militares, nacionais e estrangeiras. Além disso, existe planejamento semanal de treinamento técnico e tático, visando à manutenção e ao aperfeiçoamento das habilidades operativas dos policiais. O condicionamento físico e a defesa pessoal, do mesmo modo, não são deixados de lado, atendendo às condições necessárias para o agente manter-se ativo no GPI. A preparação psicológica, inerente ao serviço policial, é ainda mais exigida nos grupos especiais. Todos esses cuidados e exigências são fundamentais a fim de manter os “gepianos” aptos tecnicamente, fisicamente e mentalmente para o desenvolvimento de suas atividades especializadas.
Outro aspecto positivo, conquistado com a adoção da estrutura de GPIs nas Superintendências Regionais, foi a possibilidade do repasse do conhecimento, consolidado tanto pela doutrina empregada como pela prática vivenciada, aos demais policiais que trabalham no estado mediante a oferta periódica de treinamentos. A transferência do conhecimento não se restringe, contudo, aos colegas da Polícia Federal. Ministram-se cursos de formação e de educação continuada para outras forças de segurança, tanto no País como para Nações amigas, sempre com a chancela e supervisão da ANP – Academia Nacional de Polícia, centro de excelência em educação policial e referência na América Latina. Essa vivência de ensino internacional será abordada mais adiante, em capítulo distinto.
Por uma questão didática e organizacional, a obra foi dividida em três partes. A primeira, mais conceitual, apresenta informações detalhadas sobre a origem dos grupos na Polícia Federal, particularidades da criação do projeto, a formação básica através do Curso de Técnicas de Intervenção, a capacitação continuada, preparação física, a rotina e o dia-a-dia dos operadores. Revela, ainda, um panorama sobre todos os GPIs em funcionamento pelo País, apontando alguns problemas enfrentados no atual modelo e sugestões a um futuro aprimoramento do projeto, além de trazer particularidades sobre os equipamentos e armamentos utilizados. A segunda parte, mais prática, narra a participação detalhada dos GPIs em variadas operações, todas reais, demonstrando a versatilidade do emprego dessas equipes especializadas, esmiuçando a atuação desses policiais com uma abordagem particularmente focada no combate ao crime organizado e na atividade contraterror desempenhada nos grandes eventos esportivos. Na terceira e última parte, não menos empolgante, agentes federais os quais operam nas unidades situadas em variadas regiões brasileiras são entrevistados pelos autores e narram missões por eles realizadas País afora, demonstrando a multifuncionalidade desses operadores e a diversidade do trabalho executado, lidando com as especificidades culturais e geográficas de cada região.
O objetivo deste livro é, enfim, aprofundar a visão sobre o emprego desses grupos de pronta intervenção na atividade policial e dentro do escopo da Segurança Pública, trazendo não apenas conceitos, mas um pouco da vivência desses policiais frente à criminalidade crescente no País e, muitas vezes, enfrentando, igualmente, a falta de recursos, sejam humanos, legais ou financeiros. De forma alguma, pretende-se encerrar o assunto, mas apresentar significativas informações, buscando subsidiar discussões e reflexões mais precisas acerca da importância do tema Segurança Pública para a sociedade.
Após a apreciação desta obra, o leitor terá uma ampla visão do funcionamento e do trabalho desenvolvido por essas unidades especiais, as vantagens colhidas por esse modelo e as dificuldades enfrentadas, mas, sobretudo, constatará que essa obstinação pela excelência e o elevado nível de competência impostos aos seus operadores nada mais são do que reflexos do mais sagrado ofício desempenhado por essas unidades: preservar vidas.