“Senhor, eu devo ser humilde e anônimo mas, como conseguir   Senhor – sem a Vossa ajuda – livrar-me da vaidade da missão cumprida, do orgulho   da consciência imperturbada? Sei ainda, Senhor, que no cumprir das minhas   tarefas, irá aguardar-me, comumente, a incompreensão e o inconformismo de muitos   daqueles por quem veio, e pelos os quais hei de assistir a agonia do   companheiro-guardião mais próximo de meu coração, imbuído ele, como eu, dos   mesmos ideais que foram aceitos com destemor em dia solene e inesquecível. Fazei   então Senhor, nesses instantes amargos e depressivos que tornam obscuros por   densa cortina d’água, os meus olhos e minhas mãos procuram, debalde,   ensangüentadas, estancar o fluído vital que se esvai e levará consigo o último   estertor do amigo que eu assistir acabrunhado, que não me revolte eu, ou me   deixe dominar pela ira e pela irracional sede de vingança. Fazei, Senhor, que eu   me recorde de tudo aquilo que me foi ensinado, tornando-me mais humano e menos   mortal que os outros homens e disciplinarmente, compreenda e acate os Vossos   desígnios.
          Dai-me Senhor – por acréscimo – as qualidades que necessito   para compartilhar da dor alheia e entender a tragédia humana dentro dos seus   reais limites, jamais permitindo o ingresso de alguém numa trilha quase sempre   sem retorno. Dai-me Senhor, ainda, a vitalidade perene da minha consciência,   através da lucidez, do equilíbrio de atitudes, da sensatez, da firmeza, da   determinação, da coragem, da fé nos destinos maiores do ser humano e de toda a   humanidade, para que eu jamais hesite ou retroceda ante o dever, esteja ausente   do combate quando minha presença se fizer necessária no instante-momento,   relâmpago-espaço, da decisão e da ação em defesa daqueles a quem dedico minha   efêmera existência.
          Finalmente, Senhor, dai-me – mesmo nos momentos de repouso –   o cansaço da reflexão, que me amadurecerá o espírito, o dom da autocrítica, que   impedirá o embotamento de meus sentidos e o adormecimento do meu alerta   interior... para quando... em chegada a minha hora derradeira e em Vossa   Presença, possa afirmar sentidamente que fiz tudo que me fôra possível fazer. E   – quem sabe? – Senhor, perceber o Vosso magnânimo sorriso e o leve toque de   Vossas mãos divinas sobre minha cabeça compungida, a dizer-me que eu levante o   rosto e Vos encare, pois fui um justo na face da terra..."
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